Inseguro na profissão de intérprete de papéis memoráveis, como o Abel de ‘A Força do Querer’, ele confessa: já se aventurou em inúmeros negócios e faliu!
O saudoso poetinha Vinicius de Moraes brincava: “Filhos, melhor não tê-los”. Mas até parece… Que o diga o dedicado seu Abel, de A Força do Querer, interpretado pelo astro Tonico Pereira. Na trama, o personagem vive na cola do herdeiro, Zeca (Marco Pigossi), que ainda dá um trabalhão ao pai. Basta ver o esforço que Abel faz para mantê-lo bem longe da “caninana” Ritinha (Isis Valverde). “Tenho até recebido parabéns de pais tradicionais como ele, nas ruas”, comenta Tonico, que, diferentemente de Abel, não tem como apelar para alguma “santinha” o ajudar com os quatro filhos. “Sou um ateu completamente religioso!”
O artista é pai dos gêmeos Antonio Nicolau e Nina Sofia, de 12 anos, fruto da relação com a coreógrafa Marina Salomão. E também de Daniela, 43, e Thaia, 40, do primeiro casamento com a professora Eliane Pereira. “Ainda tem mais um reclamando paternidade, mas é engraçado, porque quando falei que faria o exame de DNA, ele sumiu”, dispara, sem papas na língua. E emenda aos risos: “Ah, se não falar essas coisas, não serei eu!”
Outra curiosidade: mesmo com 49 anos de carreira e mais de 20 novelas, sem contar os inúmeros prêmios e os papéis no cinema, Pereira admite: ainda tem medo de que a carreira de ator possa, sabe-se lá o porquê, não dar mais certo. “Ainda bem que não anda me faltando contrato. A Globo me respeita muito. O resto que acontece comigo de errado são as minhas falhas pessoais e humanas que me levam a loucuras. Mas também se não fazê-las, a vida não vale a pena, né?”, filosofa ele, dono de uma coleção de “planos B” que não deram certo. Tonico já foi, por exemplo, dono de peixaria, livraria, loja de porcas e parafusos, concessionária de carros… Agora, ele vende camisetas com os dizeres que cria, em uma pequena loja em Botafogo, no Rio.
Mas, claro, os milhares de fãs pelo Brasil gostam, mesmo, é de ver Tonico em ação como grande ator que é!
TITITI – Além de brilhar em A Força do Querer, você vende as camisetas. Elas te dão uma segurança a mais financeiramente? Tonico Pereira – Olha, meus planos B já me levaram à falência umas oito vezes. Mas, de qualquer maneira, é um ponto que considero importante, pois não me sinto seguro como ator. Afinal, é uma profissão nada segura. Então, fico tentando outras vias e, daí, vou falindo cada uma delas enquanto a atuação sustenta minhas loucuras (risos). Não sou artista. Sou um ator de ofício.
TITITI – Acaba que, justamente, o ofício o sustenta…
Tonico Pereira – A profissão de ator me segura, mas com a cabeça completamente instável. Tô devendo muito, meu apartamento é hipotecado. São R$ 18 mil. Se não pagar, perco. Mas tudo bem, estou vivo, respirando. Uma das minhas camisetas diz: “Meu projeto de vida é minha próxima respiração” (gargalhadas).
TITITI – De que já trabalhou nesta vida acreditando que a arte não fosse render dinheiro?
Fui gerente de vendas de banco, tive peixaria na Cidade de Deus (comunidade carioca), livraria em Niterói (RJ), botequim em Botafogo… Fui sócio de quatro agências de automóvel. Até com avião de contrabando já trabalhei!
TITITI – Que história é essa?!
Tonico Pereira – Só vou contar porque já prescreveu (risos). Tinha 15 ou 16 anos e um amigo possuía um caminhão e fazia transporte pelo país. Trazia contrabando e eu vendia para a alta sociedade. Lança-perfume, relógios, cigarros… Em um Carnaval a gente encheu um apartamento de quatro quartos de muamba e vendi tudo. Você não imagina o quanto ganhei!
TITITI – Em nenhum momento passou pela sua cabeça que a carreira de ator poderia ser seu principal ganha-pão?
Tonico Pereira – Nunca achei, mesmo, que um dia fosse ser ator. Não era meu objetivo. Mas, num determinado momento, isso começou a me sustentar. Segundo uma das minhas filhas, sou um ator improvável… Também fui um pai improvável (risos).
TITITI – Por que pai improvável?
Tonico Pereira – Estou mais presente com os gêmeos (Antonio Nicolau e Nina Sofia). Tem uma diferença enorme entre o pai que fui com minhas filhas mais velhas e o que sou com eles. Fui péssimo para as duas primeiras. Inclusive porque vim do interior para a cidade grande, tendo de vencer de qualquer maneira, sem nenhuma ajuda de nada, a não ser da minha curiosidade diante do mundo.
TITITI – Hoje consegue ser amigo de todos os herdeiros?
Tonico Pereira – Gostaria muito de ser e talvez não dê nesse momento. Mas espero que, depois de morto, meus filhos se reconheçam em mim. E não quero ser admirado por ser pai, não. Ser pai não quer dizer nada! Eles têm que gostar de mim porque sou um homem legal, que dá liberdade, e quer também.
TITITI – E como é a sua relação com o seu pai, Hernandes Pereira?
Tonico Pereira – Não tenho muito tempo de vê-lo, mas sei que vou sentir muito quando ele se for. Isso se eu não for primeiro, né? Tudo é possível. Fui distante por tanto tempo e só a vida, depois de muitos anos, me fez entender que meu pai é muito legal. Agora está com 93 anos. Ao mesmo tempo, passou todos esses anos sem me dar nenhuma orientação. É um pardal que roda em torno da minha cabeça sem pousar, para não interferir no meu pensamento. Mas, hoje, o admiro bastante.