Santuário para recuperação da espécie é montado na Chapada dos Guimarães, em Mato Grosso, e vai receber suas primeiras moradoras
Costuma-se dizer: “Quem lembra de tudo tem ‘memória de elefante’”. A expressão é válida não apenas pelo tamanho do animal em questão mas porque ele é reconhecidamente capaz de acumular e reter conhecimento por décadas: lugares, vozes, aromas, rotas, habilidades.
É possível, então, afirmar que Maia e Guida vão guardar na lembrança – e por muito tempo – o caminho histórico que estão prester a percorrer. As duas elefantas asiáticas vão viajar 1600 quilômetros: do cercado onde vivem em Paraguassu (MG) até uma propriedade na Chapada dos Guimarães (MT). Serão as primeiras moradoras do Santuário de Elefantes Brasil, o único do tipo na América Latina.
A jornada dos animais começou, na verdade, há muito tempo: as duas foram capturadas ainda filhotes, 40 anos atrás, na Tailândia, e eram exibidas em um circo de Salvador até 2010, quando foram aposentadas dos picadeiros por determinação do Ibama. Desde então estavam sob os cuidados do advogado da atração, sem destino certo ou ambiente adequado.
Os caminhos de Maia e Guida se cruzaram recentemente com o sonho da publicitária Junia Machado, presidente do Santuário. Nos últimos 12 anos ela largou a carreira, vendeu a própria empresa e resolveu dedicar-se à causa do seu animal favorito desde a infância. A partir de 2010 Junia realizou um levantamento dos elefantes em cativeiro – são 50 na América do Sul e cerca de 5 mil no mundo –, tornou-se representante da ElephantVoices e começou a idealizar o Santuário com o apoio de especialistas que vieram de outros países para a empreitada. “Fui ao Quênia fotografar elefantes ameaçados pelo comércio de marfi m e quando voltei vi que os animais de cativeiro e em zoológicos aqui também precisam de nós, pois são mantidos em condições inadequadas para suas necessidades físicas e psicológicas”, conta ela. Até agora não havia no país opção ideal para abrigar os elefantes apreendidos. Como a exibição deles em espetáculos já é até proibida em alguns estados e municípios, criam-se casos como o de Maia, Guida e Ramba, que aguarda no Chile o dia de mudar-se para o Santuário.
Em 2015, o Ministério Público determinou que as elefantas de Minas Gerais deveriam ficar sob a guarda do Santuário (a propriedade tem 1100 hectares, o sufi ciente para abrigar até 50 elefantes). Junia recebeu o telefonema decisivo e teve poucos meses para planejar a viagem tão inusitada. Doações e patrocínios possibilitaram a criação de caixas de transporte sob medida e um plano de ação para percorrer alguns dias na estrada com animais que pesam toneladas. Maia e Guida vão representar a inauguração triunfal do Santuário. Com ele, a região da Chapada, apontada como mística devido à sua natureza exuberante e ao seu campo eletromagnético, vai ser também referência de respeito a esses maravilhosos animais e das pessoas que vivem em função deles.