O ator não quer saber de polêmica e comemora o papel que o fez mergulhar ainda mais na cultura que tanto ama
No auge dos 31 anos de carreira, Luís Melo está feliz da
vida com seu atual personagem, o Tanaka de Sol Nascente. O motivo de tamanha
felicidade é simples: o ator é grande fã da cultura, das tradições, doutrinas e
arte japonesas.
Sem fugir de polêmicas, o artista comenta aqui sobre o
debate que sua escalação gerou entre membros da comunidade nipônica no Brasil.
Alguns disseram que a emissora deveria ter chamado um ator de descendência
oriental para o papel. Mas, com a elegância de sempre, Luis comentou: “Acho que
eles foram bastante respeitosos em relação a mim… Se você percebe o que é
arte, vai entender, não precisa discutir. Então, quer dizer que um morador de
Recife (PE) não pode fazer um personagem mineiro?”, questionou, sem perder o
bom humor.
Tem muito mais aqui nesta entrevista!
TITITI – O que podemos esperar de Sol Nascente, que está só
no comecinho?
Luis Melo – Ah, ela é uma novela para cima, que fala sobre
amizade, respeito e miscigenação. É uma trama solar, na qual temos várias
tribos. Contamos como convivem dentro desse espaço, com conflitos e diferenças,
claro, mas, ao mesmo tempo, com muito amor.
Onde vocês já gravaram?
Em Angra, Búzios e Arraial do Cabo, no Rio. Também fizemos
cenas no interior de São Paulo… Em vários locais. A novela é muito rica, já
que fala de dois grupos: os italianos e os japoneses. Por isso existem
diferenças arquitetônicas e isso também é interessante.
Você já conhecia a cultura oriental?
Sou um grande admirador da cultura japonesa. Todo o meu
trabalho sempre foi marcado por isso, sempre recebi muita influência do cinema
japonês. Quem acompanha meu trabalho sabe disso. Também me inspirou muito o
Kazuo Ohno (saudoso dançarino e coreógrafo, considerado um mestre do teatro
japonês). Inclusive o nome do meu personagem, Kazuo Tanaka, é uma homenagem a
ele. É gostoso poder passar isso para o público.
E qual é a história de vida do seu personagem?
Na realidade é isso, ele chegou ao Brasil com os italianos e
nessa viagem de Santos a São Paulo nasceu uma bela amizade, mesmo com culturas
e línguas totalmente diferentes. E isso é muito bonito de ver, inclusive na
televisão. Daí ele se casou com uma brasileira, a Rosário (Karolina
Albertassi), o grande amor de sua vida. Teve outro presente que foi a filha
dela, a Alice (Giovanna Antonelli), a quem criou como se fosse sua. É um amor
que ultrapassa esse limite do filho natural. Tanaka também é um homem que se
disponibiliza sempre para ajudar, compreender, respeitar… Ele não faz
julgamentos. Convive muito bem com as diferenças entre caiçaras, italianos e a
galera da Rota, o bar dos motoqueiros, que tem um estilo completamente
diferente do dele.
E esse convívio do Tanaka com os italianos… Como é? São
tão diferentes…
O Tanaka se diverte muito com os italianos. Ele gosta muito dessas
diferenças, tem paixão! Ele ama receber essa família. Esses dois patriarcas
(Tanaka e Gaetano, de Francisco Cuoco) são quase irmãos. E eu me deixei levar
por essa alegria italiana também.
Embora você tenha essa influência japonesa, como é sua ancestralidade?
Sou descendente de índios e italianos. A família por parte
de mãe é do Mato Grosso e mistura um pouco de índio e baiano. O pai que é
italiano. E acho que o índio é muito próximo disso (refere-se à fisionomia
oriental), né? Não sei como foi feita essa divisão, como se rompeu o planeta e
foi parar um pouquinho para lá e outro pouquinho para cá… (risos). Então eu
acho que tem muita coisa que é próxima. Se você pegar costumes, tradições e
rituais, por exemplo, tem tudo muito a ver com a dança do índio. São
manifestações muito próximas! Essa delicadeza, esse amor à natureza…
Algumas novelas já mostraram culturas diferentes da nossa,
claro! Em Belíssima (2005), por exemplo, Tony Ramos falava certas palavras em
grego. Vai ter isso em Sol Nascente?
Não muito. A gente está procurando dar uma pincelada com
relação a isso, como qualquer outra coisa. Quando a gente faz uma novela que
tem um ar mineiro, coloca-se um saborzinho de pão de queijo ali (risos). No
japonês tem muito disso, essa tranquilidade de ver as coisas, o ponto de vista
deles…
Mas o texto vem com algumas coisas, tipo um arigato
(obrigado), um sayonara (adeus, até logo)…
Vem! Às vezes, a gente coloca uma coisa que poderia ser mais
significativa naquele momento, mas de fácil compreensão pelo público. Estamos
tendo bastante cuidado com relação a isso. As coisas são mais sugeridas do que
feitas.
Recentemente, atores orientais acusaram a novela de
preconceito por ter escalado você para o Tanaka, em vez de um ator oriental. O
que pensa sobre isso?
Não tem o que falar. Onde está o problema na realidade? O
problema está nas próprias pessoas! No fundo, eles não querem questionar
absolutamente nada. Se são artistas, sabem que se trata de uma ficção! Não é
uma questão de quantos nãos a gente recebe. Às vezes, você morre de vontade de
fazer uma coisa, mas não é aquele o momento.
Então para você é legal esse tipo de debate?
Acho legal que todo mundo se posicione com relação a isso e
comece a se discutir um pouco. Dentro da própria cultura oriental, as mulheres
não podiam fazer teatro. Eram proibidas. Então tal proibição já existia ali
dentro. Já começa por aí. Eram homens que faziam papéis femininos. As mulheres
não pisavam no teatro. Só isso.
Nessa imersão no mundo oriental, tem algo que levará para a
sua vida?
Bastante! Sempre me encantou essa maneira da representação
no sentido do que é realmente necessário. Eles têm muito isso. Os códigos são
muito claros. A postura, o comportamento, a coisa do limpar o chão que você vai
trabalhar… Lá, quem limpa o chão do teatro é o próprio ator. Isso é um
respeito pela cultura, algo importante para a disciplina de qualquer pessoa em
qualquer tipo de arte. Isso me influencia bastante na hora do trabalho, sempre
me permeia, é uma coisa belíssima. Na literatura, no teatro, na música… Tudo
vem dos gregos ou dos orientais. A base está toda ali, principalmente a
simplicidade.